"Nunca conheci quem tivesse levado porrada."

2004/07/30

25 de Abril da Biologia




Fruto da minha formação académica em engenharia, desde cedo comecei a ter consciência de que, muitas das vezes, “coisas” simples sustentavam “estruturas” complexas. Por exemplo, toda a informação que é trocada no interior dos nossos computadores, assenta no simples código binário, que não é mais do que uma simples série de sucessões de 1 e 0. Recentemente, com a minha “troca de camisola” para a biologia, constatei que toda a informação genética se encontra alicerçada em apenas quatro letras (químicas): A, T, G e C. Falo obviamente do código genético, inscrito na molécula de ADN (ou DNA).

O 25 de Abril da Biologia (entenda-se como revolução científica) aconteceu uma dezena de anos antes do nosso 25 de Abril de 1974.

A revista científica Nature publicou, no dia 25 de Abril de 1953, um artigo de dois investigadores do Laboratório de Cavendish da Universidade de Cambridge, onde é “sugerida” uma possível estrutura do DNA. Os dois investigadores, Francis Crick e James Watson, com este artigo, algo cauteloso em termos de conclusões da importância biológica da estrutura, iniciaram toda uma nova era na ciência moderna. O referido artigo, pura e simplesmente notável pela simplicidade e objectividade de escrita, significou o sinal de partida para a elevação da biologia como a ciência do século XX e XXI. Em 1962, a Academia Sueca reconhece a sua importância ao atribuir o Prémio Nobel da Medicina a Watson e Crick.

Hoje, passados que estão 50 anos deste marco da ciência, achei por bem partilhar com vocês algumas coisas que li sobre o DNA.

Um bem disposto mas excelente artigo de Martin Kemp, professor de História de Arte da Universidade de Oxford, publicado recentemente, evidencia as diferentes interacções da estrutura do DNA com a arte. Argumenta que nunca nenhuma molécula na história da ciência alcançou tal patamar de importância, concluindo estarmos perante a Mona Lisa da ciência moderna.

Por outro lado, acho também interessante conhecer o que pensam os autores da estrutura do DNA e qual a importância que a data desta descoberta teve para eles. Assim sendo, tive a oportunidade de ler dois registos, diferentes no tempo, da visão dos dois homens sobre todo o processo intelectual que resultou na construção da dupla hélice da estrutura do DNA. É evidente a diferença de postura entre os dois, no entanto, ambos afirmam que o trabalho em equipa e a discussão aberta e franca de ideias foi essencial para o resultado. Watson (norte-americano e o mais jovem dos dois) é hoje director do Cold Spring Harbor, não fazendo investigação, Crick (Inglês), por seu turno, contínua a fazer investigação em laboratório. Os dois cientistas costumam dizer, humildemente, que estavam os dois juntos no local certo e na época certa e que souberam, acima de tudo, complementarem-se. Curiosamente, também se verifica que toda a estrutura do DNA assenta no simples conceito de complementaridade da vida.

A sua simplicidade é tão evidente e fascinante que foram muitos os que não queriam acreditar que uma molécula com a “responsabilidade” e funcionalidade do DNA, pudesse ter uma estrutura tão simples. Segundo os dois cientistas, o Prémio Nobel demorou ainda uns anos, devido às dúvidas que determinados nomes fortes da ciência à época, levantaram sobre tal simplicidade.

Numa altura em que se festeja por todo o mundo os 50 anos da dupla hélice do DNA, a maior lição que julgo importante retirar, e para alguém que está a iniciar-se na ciência, é o facto de que a simplicidade pode ser aliada e não inimiga da complexidade.

Eduardo Alexandre Silva


Artigo publicado no jornal O Publico e no Terras do Ave, em 2003.

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